POR QUE CREIO
QUE OS DONS SOBRENATURAIS DO ESPÍRITO SANTO CONTINUAM HOJE
Rev. Sam
Storms
Comentário de Julio Severo: O Rev. Sam Storms é um teólogo
calvinista americano. Às vezes, parece que todo calvinista é cessacionista. Mas
isso é tão verdade quanto dizer que todo calvinista é maçom. Graças a Deus, há
calvinistas se levantando contra essas duas heresias no meio deles. No final
deste artigo, há links para mais artigos sobre o mesmo assunto.
E então, por
que sou continuísta? Seguem minhas razões (por favor, note que escrevi diversos
artigos que fornecem ampla evidência para os pontos que defendo, mas a
limitação de espaço me permite apenas citá-los nominalmente). Todos podem ser
encontrados no meu site.
Deixe-me
começar com a presença sólida, certamente difundida e inteiramente positiva de
todos os dons espirituais por todo o Novo Testamento (NT). Os problemas que
surgiram na igreja de Corinto não se deram por conta dos dons espirituais, mas
por pessoas imaturas. As advertências de Paulo não se referiam aos dons de Deus,
mas, sim, à distorção infantil, ambiciosa e orgulhosa da parte de alguns.
Além do
mais, começando com o Pentecoste e percorrendo todo o livro de Atos, vemos que
toda vez que o Espírito era derramado sobre os novos convertidos, eles
experimentavam do seu carisma. Não há nada que indique que esses fenômenos eram
restritos a eles e à época. Tais manifestações parecem ser tanto difundidas
quanto comuns na igreja do NT. Os cristãos em Roma (Rm 12), Corinto (1 Co
12-14), Samaria (At 8), Cesareia (At 10), Antioquia (At 13), Éfeso (At 19),
Tessalônica (1 Ts 5) e Galácia (Gl 3) experimentaram dos dons de milagres e
revelação. É difícil imaginar como os autores do NT poderiam ter falado mais
claramente sobre como deveria ser o Cristianismo da Nova Aliança. Em outras
palavras, o fardo de provar o contrário está com o cessacionista. Se certos
dons de uma classe especial cessaram, a responsabilidade de prová-lo depende
dele ou dela.
Evidência
Extensa
Gostaria de
apontar também a extensa evidência neotestamentária dos chamados dons
milagrosos entre cristãos que não são apóstolos. Ou seja, vários homens e
mulheres que não eram apóstolos, jovens e anciãos, em toda a extensão do
império romano exerciam de maneira consistente esses dons do Espírito (e
Estevão e Felipe ministravam no poder de sinais e maravilhas). Aqueles que
exerciam os dons miraculosos, mas não eram apóstolos são (1) os 70 que foram
comissionados em Lucas 10.9, 19-20; (2) pelo menos 108 pessoas dentre os 120
que estavam reunidos no salão superior no dia de Pentecostes, (3) Estevão (At
6,7); (4) Felipe (At 8); (5) Ananias (At 9); (6) membros da igreja de Antioquia
(At 13); (7) convertidos anônimos em Éfeso (At 19.6); (8) mulheres em Cesareia
(At 21.8,9); (9) os irmãos sem nome de Gálatas 3.5; (10) crentes em Roma (Rm
12.6-8); (11) crentes em Corinto (1 Co 12-14); e (12) cristãos em Tessalônica
(1 Ts 5.19,20).
Também temos
que dar espaço para o objetivo explícito e frequentemente repetido do propósito
dos carismas: nomeadamente, a edificação do corpo de Cristo (1 Co 12.7; 14.3;
26). Nada do que leio no NT ou do que vejo na condição da igreja em qualquer
era, passada ou presente, me leva a crer que progredimos além da necessidade
pela edificação – e consequentemente além da necessidade pela contribuição dos
carismas. Eu confesso livremente que os dons espirituais foram essenciais para
o nascimento da igreja, mas por que eles seriam menos importantes ou
necessários para o crescimento e amadurecimento contínuos?
Há também a
continuidade fundamental ou o relacionamento espiritual orgânico entre a igreja
de Atos e a igreja dos séculos subsequentes. Ninguém nega que houve uma era ou
período no começo da igreja que chamemos de “apostólica”. Temos que reconhecer
o significado da presença pessoal e física dos apóstolos e o seu papel único na
formação da fundação da igreja nos primeiros séculos. Mas não há no NT qualquer
coisa que sugira que certos dons espirituais eram exclusiva e unicamente
ligados a eles ou que os dons se encerraram com a partida deles. A igreja
universal ou corpo de Cristo que foi estabelecida por meio do ministério dos
apóstolos é a mesma igreja universal e corpo de Cristo hoje. Estamos juntos com
Paulo, Pedro, Silas, Lídia, Priscila e Lucas, membros do mesmo corpo de Cristo.
Bem ligado
ao ponto anterior é o que Pedro diz em Atos 2, referente aos ditos dons
miraculosos como característicos da era pactual da igreja. Como já disse D. A.
Carson: “A vinda do Espírito não está associada meramente com o nascimento da
nova era, mas com a sua presença, não meramente com o Pentecoste, mas com todo
o período do Pentecoste até o retorno de Jesus, o Messias” (em A Manifestação
do Espírito, Ed. Vida Nova). Novamente, os dons de profecia e línguas (At 2)
não são retratados como mera inauguração da nova era pactual, mas para
caracterizá-la (não esqueçamos de que a era atual da igreja equivale aos
“últimos dias”).
Devemos
também notar 1 Coríntios 13.8-12. Nesse texto Paulo certifica que os dons
espirituais não “passarão” (ver v.8-10) até a vinda do “perfeito”. Se o
“perfeito” é realmente a consumação do propósito redentivo de Deus tal qual
expressado pelo novo céu e nova terra seguindo a volta de Cristo, podemos
confiantemente esperar que Ele continue a abençoar e capacitar a sua igreja com
dons até àquela hora.
Um ponto
semelhante aparece em Efésios 4.11-14. Aqui, Paulo fala de dons espirituais
(junto com o ofício de apóstolo) – e particularmente dos dons de profecia,
evangelismo, pastoreio e ensino – como construção da igreja “até que todos
alcancem a unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à
maturidade, atingindo a medida da plenitude de Cristo” (V. 13, NVI – grifos
meus). Já que a plenitude de Cristo certamente ainda não foi atingida pela
igreja, podemos antecipar com confiança a presença e o poder de tais dons até
que aquele dia chegue.
Gostaria de
também apontar a ausência de uma noção explícita ou implícita de que devemos
enxergar os dons espirituais de maneira diferente que outras práticas e
ministérios neotestamentários retratados como essenciais à vida e ao bem estar
da igreja. Quando lemos o NT, parece evidente que a disciplina na igreja deve
ser praticada em nossas assembleias atuais, devemos celebrar a mesa do Senhor e
o batismo com água e que os requerimentos para o exercício do ancião como
descrito nas epístolas pastorais ainda determinam como a vida na igreja deve
ser levada, citando apenas alguns. Quais boas razões exegéticas ou teológicas
podem ser dadas para explicar por que devemos tratar a presença e operação dos
dons espirituais de maneira diferente?
Testemunho
Consistente
Ao contrário
do que muitos pensam, há um testemunho consistente ao longo de grande parte da
história da Igreja referente à operação dos dons miraculosos do Espírito.
Simplesmente não é verdade que os dons cessaram ou desapareceram da vida no
começo da Igreja após a morte do último apóstolo. O espaço não permite citar a
evidência maciça concernente, então me referirei a quatro artigos que escrevi
com uma documentação extensa (ver Spiritual Gifts in Church History).
Cessacionistas
frequentemente argumentam que sinais e maravilhas, assim como certos dons,
serviram somente para confirmar e autenticar o grupo original de apóstolos e
que quando esses morreram, também cessaram os dons. A verdade é que nenhum
texto bíblico (nem mesmo Hb 2.4 ou 2 Co 12.12, dois textos que explico em
artigos no www.samstorms.com) chega
a dizer que sinais e maravilhas ou certos dons espirituais serviram para
autenticar os apóstolos. Sinais e maravilhas autenticaram Jesus e a mensagem
apostólica referente a ele. Se sinais e maravilhas foram designados
exclusivamente para autenticar os apóstolos, não temos como explicar porque
pessoas que não eram apóstolos (como Felipe e Estevão) foram capacitados a
exercê-los (ver especialmente 1 Co 12.8-10, onde o “dom” de “milagres”, entre
outros, foi dado a crentes medianos, que não eram apóstolos).
Portanto,
essa é uma boa razão para ser cessacionista apenas se você puder demonstrar que
a autenticação ou testificação da mensagem apostólica era o propósito único e
exclusivo de tais demonstrações de poder divino. Todavia, em nenhum lugar do NT
o propósito ou função dos milagres ou carismas é reduzido à testificação. O
agir miraculoso, em qualquer forma que seja, servia a outros propósitos distintos:
doxológico (para glorificar a Deus: Jo 2.11, 9.3, 11.4, 11.40 e Mt 15.29-31);
evangelístico (para preparar o caminho para que o Evangelho fosse conhecido:
ver At 9.32-43); pastoral (como expressão de compaixão e amor e cuidado com as
ovelhas: Mt 14.14; Mc 1.40,41); e edificação (para levantar e fortalecer os
crentes: 1 Co 12.7 e o “bem comum”; 1 Co 14.3-5, 26).
Todos os
dons do Espírito seja línguas ou ensino, profecia ou misericórdia, cura ou
auxílio, foram dados (dentre outras razões) para a edificação, fortalecimento,
encorajamento, instrução, consolo e santificação do corpo de Cristo. Então,
mesmo que o ministério dos dons miraculosos para atestar e autenticar tenha cessado
um ponto que concedo apenas para efeitos de argumentação, tais dons teriam que
continuar a funcionar na igreja pelas outras razões citadas.
Ainda
Final e Suficiente
Talvez a
objeção mais comum dos cessacionistas seja que reconhecer a validade dos dons
de revelação, como profecia e palavra de conhecimento, necessariamente compromete
a finalidade e suficiência das Escrituras Sagradas. Mas esse argumento é
baseado na falsa suposição de que esses dons nos dão verdades infalíveis com
igual autoridade à do próprio texto bíblico (veja o meu artigo “Why NT Prophecy Does NOT Result in
‘Scripture-Quality’ Revelatory Words“).
Também é
mencionado o apelo cessacionista a Efésios 2.20, como se esse texto descrevesse
todo o possível ministério profético. O argumento diz que os dons de revelação
como profecia foram unicamente ligados aos apóstolos e portanto designados para
funcionar apenas durante o dito período de fundação da igreja nos primeiros
séculos. Abordo esta visão fundamentalmente errônea em detalhe aqui. Um exame cuidadoso
das evidências bíblicas referentes tanto à natureza do dom de profecia quanto à
sua extensa presença entre cristãos indica que este dom servia a outros
propósitos muito além da fundação da igreja. Portanto, nem a morte dos
apóstolos, nem o desenvolvimento da igreja além dos seus primeiros séculos têm
importância sobre a validade de profecias para hoje. Também é citado com
frequência o argumento do agrupamento, por assim dizer, que diz que os
fenômenos miraculosos e sobrenaturais foram supostamente concentrados ou
agrupados em períodos específicos na história redentora. Já abordei este
argumento num outro artigo e mostrei
que é falso.
Finalmente,
apesar de tecnicamente não ser uma razão ou argumento para ser um continuísta,
não posso ignorar a experiência. O fato de que eu já vi todos os dons
espirituais sendo operados, de ter testado e confirmado e os experimentado em
primeira mão em inúmeras ocasiões. Como afirmei esta não é tanto uma razão para
se tornar um continuísta, e mais uma confirmação (apesar de não ser infalível)
da validade dessa decisão. A experiência, isolada do texto bíblico, prova muito
pouco. Mas a experiência deve ser considerada, especialmente se esta ilustra ou
incorpora aquilo que vemos na palavra de Deus.
Nota – Abertos para Reforma: texto traduzido com autorização de The Gospel Coalition, publicado originalmente no dia 23 de janeiro de 2014 aqui.
Fonte: Abertos para Reforma
Divulgação: www.juliosevero.com
Leitura
recomendada:
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