sábado, setembro 22, 2012

O NOVO CONCERTO DE JEREMIAS



 

O NOVO CONCERTO DE JEREMIAS 



Introdução: Nenhuma palavra explica melhor o tema central das Escrituras do que o vocábulo hebraico “berith”, ou concerto. Os concertos de Deus com o seu povo destacam-se no Antigo Testamento como cumes de montanhas, e a obra suprema de Cristo foi assegurada um novo e eterno concerto pelo seu sangue.
A relação instituída por concerto, no entanto, é vaga e estranha para o moderno estudioso da Bíblia. Existe uma lacuma cultural que deve ser transposta para penetrar no mundo dos antigos israelitas, para os quais a mais bela arte da vida era saber negociar acordos eficazes.

Para compreender o significado dos concertos divinos, não há melhor ponto de partida do que a vida de Jeremias. De todos os profetas, só ele assistiu o ruir do antigo concerto e o advento do novo. Embora tivesse predito a destruição de Jerusalém, o choque de caminhar sobre os destroços deixados pelas hordas babilônicas quase o aniquilou; haviam sido obstruídos todos os símbolos externos do concerto de Jeová, destinado justamente a fornecer e preservar a nação!

Foi nesta hora crucial que Jeremias recebeu por inspiração a esperança de um novo concerto. Após um rápido estudo da aplicação geral dos concertos no Antigo Testamento, podemos examinar com proveito os conceitos de Jeremias sobre o assunto. É necessário responder aqui a três perguntas importantes: Por que o Antigo concerto foi substituído? Quais são as características do Novo Concerto? Como se relaciona este com a mensagem do evangelho?

§   CONCERTOS DO ANTIGO TESTAMENTO


Berith”, vocábulo cognado do assírio “biritu”, que designa um elo ou cadeia, significa um compromisso solene em que participam dois homens ou duas partes.  Os orientais consideravam tais acordos inalteráveis, pois o seu código de honra exigia que a palavra de um homem fosse sagrada. O “berith” sempre instaurava um estado de “shalom”, que significa paz, inteireza, comunhão harmoniosa no seio de uma família ou entre amigos. Por vezes, estes dois termos, sinônimos de concerto e paz, são permutáveis, como, por exemplo, em Gênesis 26. 28, 31; I Reis 5. 12; Salmo 55. 20, 21. Entrar num concerto significa, portanto, fazer paz. (¹).

Os pactos de sangue (dos mais antigos) introduziam um estranho no seio de um clã familiar. Os pactos relativos à propriedade agrária estabeleciam delimitações de terrenos e direitos de água. Os acordos militares destinavam-se a evitar a guerra. O pacto feito por Josué os gibeonitas forçou-o a desobedecer a Deus e a poupar-lhes a vida, apesar desse pacto basear-se no engano. O casamento era sempre uma relação pactual, e não raro exigia negociações externas, promessas e troca de dádivas entre as duas famílias intervenientes.

Um concerto ou pacto formal era constituído por quatro partes:

1)           Os termos e compromissos do acordo;

2)         Os juramentos feitos pelas pessoas envolvidas no pacto;

3)    As maldições invocadas por cada uma das pessoas sobre si própria, se alguma vez violasse o concerto; e

4)         A ratificação do pacto mediante determinado sinal externo (²).

Quanto a este quarto ponto, importantíssimo, o Antigo Testamento assinala surpreendente variedade de ritos e símbolos. Um símples aperto de mão selou o pacto de Nabucodonozor com o rei Zedequias (Ez 17. 18), como também o acordo entre os sacerdotes do tempo de Esdras, ao comprometerem-se a repelir as suas mulheres estrangeiras. A intimidade um beijo confirmava outros pactos, como a unção de Saul para ser rei. Para Jacó e Labão, o sinal do seu pacto foi um monte de pedras. Trocavam-se solenemente dádivas, como em I Samuel, quando Jônatas e Davi juraram amizade para a vida inteira. Abimeleque, desejando concluir um pacto com Isaque, foi por este convidado a um banquete (Gn 26. 30).

Para os hebreus, o sinal mais significativo de um pacto era um sacrifício de sangue realizado perante Deus. Primeiro, dividia-se o animal sacrificado em dois pedaços, colocados de forma a permitir que as partes aliadas passassem por entre elas (Gn 15. 17; Jr 34. 18). Foi este rito antigo que deu origem à frase idiomática hebraica “talhar um concerto”, que ocorre freqüentemente no texto original onde se esperaria ler “fazer um concerto”.  Finalmente, o sacrifício era assado e comido como refeição comum, outro símbolo tradicional de intimidade e paz.

Quando nos deslocamos do nível humano para o divino nesta matéria, descobrimos ainda outras formas de ratificação. Para Noé um arco-íris foi o sinal de que Deus nunca mais destruiria a terra por meio de um dilúvio. Abraão anuiu ao sangrento rito simbólico da circuncisão, mas assistiu também ao símbolo misterioso do facho ardente passando entre as peças do sacrifício. No Sinai, o tremendo concerto da Lei foi selado quando Moisés aspergiu o povo com sangue, apresentando em seguida às duas tábuas de pedra do decálogo. Quando essas tábuas foram guardadas na arca, também esta se transformou num símbolo do concerto mosaico. A promessa de Deus a Davi e à sua posteridade foi confirmada pela construção do templo (II Sm 7. 25).

§   A FRAQUEZA DO ANTIGO PACTO

O que levaria um profeta tão fiel como Jeremias a chegar à conclusão que o aspecto mais precioso da sua religião, o concerto do Sinai, necessitava de ser substituído? Jamais negou a santidade da lei e, quando o livro de Moisés foi descoberto em 621 a. C., participou energicamente das reformas instauradas pelo rei Josias, que tinham por objetivo a realização do Velho Concerto.

Dois acontecimentos históricos lhe devem ter aberto os olhos. Por um lado, viu o miserável fracasso dessas reformas, pois a nação mal se deteve na busca agitada da maldade, em todas as suas formas, de idolatria e de intriga política. Contudo, ela havia ido longe demais (Jr 11. 10; 31. 32). Avizinhava-se o castigo de Deus! Jeremias viu, por outro lado, os trágicos resultados finais desse castigo: o templo em ruínas, as muralhas e edificações da cidade jazendo por terra, e os judeus mortos ou levados cativos.

Estes acontecimentos obrigaram o profeta a sujeitar a sua fé e consciência a novo exame, e recebeu novamente a mensagem de Deus em poder renovado, revelando-lhe os aspectos permanentes, santos, do antigo concerto, e também as suas fraquezas essenciais:

1)           Fora escrito em placas de pedras e não no coração do povo, tornando-se assim legalista, externo, cerimonial (Jr 31. 33);

2)         Fora alterado e deturpado pelos sacerdotes e escribas (Jr 8. 8), perdendo, assim, a sua forma moral num labirinto de tradições humanas;

3)          Fora descurado, esquecido até pelos sacerdotes, perdendo-se no templo, em vez de fielmente ensinado de geração em geração;

4)         Acima de tudo, não tinha poder para retirar o pecado dos transgressores.

Todas essas fraquezas do antigo concerto se sintetizam numa única e simples verdade: podia ser violado pelo povo! E, de fato, foi-o, repetidas vezes, através de toda a história de Israel.

Deus encontraria nova forma de preservar a santidade de sua lei moral, para evitar que o seu povo quebrasse o vínculo do concerto. “Naqueles dias, diz o Senhor, nunca mais se dirá: A arca do concerto do Senhor, nem lhes virá ao coração, nem dela se lembrarão, nem a visitarão; isto não se fará mais” (Jr 3. 16). O seu lugar seria ocupado por algo de novo e de superior.

§    CARACTERÍSTICAS DO NOVO CONCERTO

Jeremias reconheceu a existência de uma esfera substancial de acordo – e, até, de repetição – entre o antigo e o novo concerto: ambos afirmam o primado da lei; ambos procuram unir Deus com o homem, e ambos oferecem bênçãos divinas e futuras recompensas.

Ao mesmo tempo, teve uma visão espantosa da natureza do novo concerto, que seria um dia ratificado por Deus.

1)           Seria interior e espiritual, alterando a vida interior e a alma (Jr 31. 33);

2)         Seria um concerto individual dando a cada filho de Deus um conhecimento pessoal dele (Jr 31. 34);

3)          Seria um concerto universal para todos os homens, dos ínfimos aos mais destacados (Jr 31. 34).

Além dessas, haveria mais três características do novo concerto:

1)           Instauraria verdadeira união entre Deus e o seu povo: “Eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo”;

2)         Traria verdadeiro conhecimento de Deus: “Não ensinará alguém mais ao seu próximo... porque todos me conhecerão”;

3)          Asseguraria verdadeiro perdão de Deus: “Porque lhes perdoaria a sua maldade, e nunca mais me lembrarei dos seus pecados” (Jr 31. 33, 34).

Também no capítulo 32 o profeta sublinha o caráter íntimo e imediato do novo concerto. “E lhes darei um mesmo coração e um mesmo caminho, para que me temam todos os dias; e farei com eles um concerto eterno... e porei o meu temor no seu coração”. (Jr 32. 39, 40). Isto está de acordo com o brado anterior de Jeremias: “Circuncidai-vos para o Senhor, e tirai os prepúcios do vosso coração”, ecoando uma frase semelhante do próprio Moisés, registrada em Dt 30. 6. O apóstolo Paulo utilizou este mesmo argumento da religião do coração para mostrar como os crentes gentios comungavam na bênção: “Mas é judeu o que o é interior, e circuncisão a que é do coração, no espírito, não na letra, cujo louvor não provém dos homens, mas de Deus” (Rm 2. 29).

O hebraista alemão Keil afirma que a qualidade fundamental e característica do novo concerto é o fato de ele apagar os pecados. É esta a esperança repetida por Jeremias no seu capítulo 33, versículo 8: “E os purificarei de toda a sua maldade com que pecaram e contra mim, e perdoarei todas as suas iniqüidades”. Realiza-lo-á o “hesed” (Jr 33.11), benignidade do Senhor, pois só uma obra divina da graça poderia jamais anular as exigências da lei moral para com os homens. Assim, o novo aspecto aguardado por Jeremias seria a concessão de virtude para cumprir os requisitos da lei, exatamente o que Paulo anunciava como tendo sido realizado por Cristo (Rm 8. 3, 4).

O Velho Concerto contém mandamentos e exigências; o novo, graça, e generosidade.

Um aspecto vital do novo concerto permanecia oculto para Jeremias: o derramamento do Espírito Santo no Pentecostes. O Espírito seria o agente, o método predito por Cristo, mediante o qual o coração do crente receberia “rios de água viva” (Jo 7. 38, 39). No atual ministério do Espírito de Deus, encontramos facilmente a realização da predição de Jeremias de um concerto íntimo, individual e universal, bem como a realidade da verdadeira união, conhecimento e perdão.

§   O NOVO CONCERTO E O EVANGELHO


A boa nova que pregamos é esse corpo de fatos históricos que mostram o que Deus fez em Cristo para salvar a humanidade perdida. O novo concerto é o resultado vitorioso dessa obra redentora. A pregação não oferece ao pecador a mera possibilidade de regressar à comunhão com Deus, mas um tratado de paz, eterno, realizado, assinado e selado, que ele deve aceitar ou rejeitar. Esta relação estabelecida pelo concerto, retumba em Romanos 5, quando o apóstolo exclama: “Sendo, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus”.

O evangelho mostra Cristo de pé, batendo à porta do coração humano com a oferta: “Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta entrarei a ele, e comerei com ele, e ele comigo”. Para a mentalidade ocidental, esta expressão parece algo estranho, mas para o apóstolo João e seus leitores, tão habituados a relações firmadas por concertos, era este o símbolo precioso da refeição comum que poria termo a todas as hostilidades e inauguraria uma era de união e paz.

Uma mensagem sobre o “Pacto Eterno entre Deus e o Homem” poderia, primeiro, mostrar como se ratificavam concertos mediante penhores e símbolos solenes na Bíblia, e depois desenvolver estes dois tópicos relacionados:

1)      O sinal do sacrifício de Cristo, cujo “sangue do concerto foi derramado para perdão dos pecados”, e

2)      O sinal do selo do Espírito Santo implantado no coração do crente para evidenciar tanto a sua posse atual da salvação como a sua herança futura. O capítulo primeiro de Efésios descreve explicitamente esses dois símbolos irrevogáveis do novo e eterno concerto de Deus.

Ao abortar um tema profético, como “das trevas para a luz”, o pregador pode seguir, passo a passo, a realização da profecia de Jeremias desde:

1)           A noite de desespero, em que a arca, o templo e a cidade foram destruídos; passando pelo;

2)         Alvorecer, com o regresso de um remanescente que não conseguiu fazer mais do que reconstruir uma sombra da antiga glória da nação;

3)          A luz do dia, quando Cristo veio na carne e ratificou o novo e eterno concerto com o seu sangue, estabelecendo o reino de Deus no coração dos que o seguem; até, finalmente, o dia futuro da;
4)         Luz celestial, que promete que tudo se realize num sentido universal e perfeito.

Um sermão de apologética, defendendo o caráter direto da salvação, servir-se-á da grande passagem de Jeremias sobre o novo concerto para enfrentar as reinvidicações da Igreja de Roma, que afirma ser ela a única medianeira na transmissão da graça divina para salvação das almas. É verdade que, ao abrigo do antigo concerto, o conhecimento do Senhor requeria a intervenção de sacerdotes e a realização de cerimônias litúrgicas, mas é este precisamente o princípio transitório abolido no novo concerto com a concessão do Espírito Santo.

O teólogo americano B. B. Warfield diz, na sua obra sobre “O Plano da Salvação”: “O problema é, pois, saber se a operação salvadora de Deus é ou não imediata: Deus salva os homens por ação direta da sua graça sobre as suas almas, ou atua sobre eles tão somente por meio de agências estabelecidas para esse fim?”.

Para todos os evangélicos fiéis, a resposta é que, se bem que os homens e as igrejas possam colaborar com o Espírito de Deus, só Ele administra o novo nascimento e subsequentes obras da graça diretamente a todo aquele que crê.

O evangelista da atualidade deve demonstrar como o fez o profeta Jeremias, a futilidade de todos os meios externos e sacerdotais para efetuar o perdão divino, e depois proclamar a graça de Deus, que leva a salvação a todos os perdidos. Sim, “a palavra está junto de ti, na tua boca e no teu coração; esta é a palavra da fé que pregamos”.


§   NOTAS
(¹) John Petersen, Israel, Its Life and Culture (London: Oxford University Press), 1954, Part II, p. 285.
(²)  George R. Berry, “Covenant in the Old Testament”, International Standard Bible Encyclopaedia, Vol II. P. 727.

                                                                                 
                                                                                    MarriaValda
                                                                                     Professora

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