TEOLOGIA PASTORAL E AUTONOMIA DO SUJEITO NA MODERNIDADE
É assente e ponto pacífico na teologia a relação do
saber teológico com os paradigmas explicativos da realidade de seu tempo. A
teologia sempre foi e será uma ciência inculturada. Neste aspecto, é necessário
ao trabalho pastoral ensinar a comunidade a desaprender as formulações
arcaicas, os conceitos teológicos e litúrgicos ultrapassados, que não mais
falam ao homem moderno. A mera repetição de fórmulas teológicas não presta
serviço algum ao povo de Deus, muito pelo contrário, essa cantilena só pode
provocar fastio e constitui uma infidelidade e irresponsabilidade para com a
mensagem cristã. É necessária uma interpretação mais criativa dos dados da fé
transformando-os em fonte de conhecimento e renovação do ser humano.
O dogma é um caminho, uma orientação. Uma afirmação
dogmática reflete o contexto que a gerou, pois se trata de uma resposta a uma
situação epocal. Gerações que vivem em épocas diferentes devem dar novo vigor,
frescor e interpretação ao dogma. Devemos reinterpretar os enunciados
dogmáticos à luz de nossa leitura atual da Escritura. Não é possível anunciar o
Evangelho sem considerar o homem moderno, o seu destinatário.
Não é mais possível negar os reclamos
científicos que exigem da fé uma resposta dialógica. Não podemos mais aceitar
uma visão de homem que lhe negue sua completude.
Neste ínterim, a pastoral deve resgatar o sentido
de pessoa que encontra no amor e liberdade de Deus o seu fundamento. Ser pessoa
é ser livre. Heidegger afirmava que a liberdade não é uma propriedade
(Eigenschaft) do homem, mas que o homem é essencialmente livre. Entendia o
filósofo que para o homem adorar a Deus precisava estar livre de Deus, livre
para se desviar de Deus, não determinado ou compelido por Deus para adorá-lo.
Se o homem adorar a Deus deve fazê-lo mediante uma
ação livre, não compelida. Ser livre, em última instância, é ser capaz de se
decidir a favor ou não de Deus. A concepção heideggeriana de modo algum entra
em conflito com a teologia. Em Deus subsiste em toda plenitude a liberdade, o
amor e a relação, elementos pessoais constitutivos. Deus criou o homem como ser
livre, chamado para se decidir na abertura, para acolher o dom de Deus
salvador-criador e para viver o amor concreto aos outros seres pessoais e
assumir responsabilidade face ao mundo criado por Deus. Todavia, como a
experiência tem demonstrado e a própria escatologia paulina, nem todos ainda se
submetem ao senhorio de Cristo e respondem positivamente ao seu chamado (1Co
15,24-28). Não é isto indício de uma liberdade, mesmo que negativa?
Ao criar o homem como ser livre (para), o próprio
Senhor arca com a responsabilidade de o homem desejar ser livre d’Ele. O ser,
assim, é pessoa, criada pelo amor e liberdade de Deus, capaz de se decidir a
favor ou mesmo contrário a Deus. Javé decide criar o homem e o faz como um ser
livre. Embora não explícito, a última proposição conforma-se à concepção do
escritor, segundo a qual Deus criou o homem e o guia para a salvação.
O mundo é o palco no qual Deus revela o seu amor ao
homem e reafirma sua autonomia e liberdade ao permitir que ele faça suas próprias
escolhas, mesmo que essas contrariem seus mandamentos (Gn 3). Somente uma
perspectiva da liberdade de Deus e do homem pode conformar-se ao sentido de
autonomia do sujeito, da natureza e do social propalados pela Modernidade.
A pastoral, por conseguinte, não se pode fechar ao
novo contexto que tanto desafia quanto impele a Igreja ao cumprimento de sua
missão no mundo.



Perfil
Esdras Costa Bentho Teólogo, Bacharel e Licenciado em Teologia com especialização em Hermenêutica; graduado em Pedagogia (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Formação de Professores), e escritor. Atualmente concluindo o Mestrado em Teologia pela PUC, RJ, atua como professor na Faecad, RJ, trabalha como editor de Bíblias e revisor sênior para editoras cristãs.
É autor dos livros “A Família no Antigo Testamento – História e Sociologia” e “Hermenêutica Fácil e Descomplicada”, e co-autor de “Davi: As vitórias e derrotas de um homem de Deus”, todos títulos da CPAD.
Fonte:
http://www.cpadnews.com.br/blog/esdrasbentho/cultura-crista/102/teologia-pastoral-e-autonomia-do-sujeito-na-modernidade.html
Esdras Costa Bentho Teólogo, Bacharel e Licenciado em Teologia com especialização em Hermenêutica; graduado em Pedagogia (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Formação de Professores), e escritor. Atualmente concluindo o Mestrado em Teologia pela PUC, RJ, atua como professor na Faecad, RJ, trabalha como editor de Bíblias e revisor sênior para editoras cristãs.
É autor dos livros “A Família no Antigo Testamento – História e Sociologia” e “Hermenêutica Fácil e Descomplicada”, e co-autor de “Davi: As vitórias e derrotas de um homem de Deus”, todos títulos da CPAD.
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